Postado por: Emanuel Oliveira
SMPC/GTF de Vª Nª de Cerveira
Apesar de concordar com a situação crítica da gestão florestal pública, comunitária e privada, completamente subvalorizada, não podemos desresponsabilizarmos-nos das nossas responsabilidades como coordenadores de combate, principalmente quando temos a cargo vidas de terceiros que voluntariamente dão a sua vida por uma causa de todos. A floresta com elevada densidade e disponibilidade de combustível associada a uma meteorologia favorável a incêndios é um meio hostil que qualquer combatente de incêndios conhece e respeita.
Todo o combustível vegetal presente na floresta portuguesa, associado às monoculturas, principalmente, de pinheiro-bravo e de eucalipto, têm características altamente inflamáveis que com um extenso período de seca, temperaturas elevadas, humidade relativa baixa e vento forte, vão ser incrementadas.
O Presidente da LBP da sua larga experiência com ligação aos bombeiros, desde a sua juventude, também se deve recordar que até à década de 80 os bombeiros apoiavam o combate aos incêndios florestais, o qual era realizado por experientes equipas – as brigadas florestais - dirigidos pelos então designados mestres florestais do Corpo Nacional da Guarda Florestal da Direcção Geral das Florestas (actualmente incorporados na GNR com funções de fiscalização). O combate até então era realizado com pouco uso de água e muito trabalho de ferramenta manual e baseado na observação do comportamento do fogo. Muitas corporações de bombeiros ganharam esse conhecimento empírico e experiência junto das brigadas florestais, detendo hoje respeitáveis combatentes. A chegada das “autobombas” e o consequente uso abusivo da água, acompanhado do abandono das técnicas manuais levou à perda do conhecimento do comportamento do fogo.
A “violência dos incêndios e pela imprevisibilidade da sua progressão no terreno” está relacionada única e exclusivamente com o comportamento do fogo e a imprevisibilidade é tanto maior quanto o seu desconhecimento e interpretação. Hoje mais do que nunca, já não se admite no século XXI que incêndios florestais no Sul da Europa sejam combatidos unicamente com água, sem o devido acompanhamento técnico para documentação e análise, de modo a assessorar o COS, permitindo um combate mais eficaz, sem excesso de meios e de custos e, principalmente, reduzindo os riscos de vítimas em combate.
Se os bombeiros que foram vítimas dos incêndios florestais deste ano “não actuaram por aventureirismo, nem falta de conhecimentos”, então o que falhou? Se antes a "culpa" era da mudança do vento, hoje a "culpa" parece ser do abandono florestal e da mudança climática. Esta questão abre um conjunto de questões essenciais, tais como:
Foi estabelecido o Protocolo LACES? Todos os combatentes respeitaram as 10 Regras de Segurança e tiveram em consideração as 18 Situações de Risco? Conheciam e sabiam que trabalhavam na ZHM (Zona do Homem Morto)?
Exemplos como os do seguinte link demonstram falta de conhecimento e de interpretação do comportamento do fogo, pelo que arriscam-se vidas importantes com situações que campanha após campanha se repetem:
Incêndio em Arganil obrigou à evacuação da aldeia da Aveleira - País - Notícias - RTP
Não podemos nem devemos de julgar quem voluntariamente sacrifica a sua própria vida, mas a sociedade e principalmente, todos os combatentes têm o direito de saber a causa real e as condições em que se deu um acidente, com o fim de evitarmos a repetição de situações de risco semelhantes. A documentação, a análise de incêndio e os respectivos relatórios de acidentes associados são obrigatórios para uma melhoria da segurança de quem tanto dá.
Cabe-me como técnico, preocupado com o problema dos incêndios florestais e com a segurança dos combatentes, alertar o para o facto de que o combate aos incêndios não pode ser assumido como a opinião do Presidente da Liga quanto à causalidade dos incêndios florestais, pois é uma opinião baseada na sua estimativa pessoal, sem qualquer fonte que a suporte. Hoje importa, como no passado, mas recorrendo às novas tecnologias e técnicas, assessorar a importante tomada de decisão do responsável pelo combate, com base em dados registados no ambiente de fogo, na análise ao comportamento do fogo e no estrito cumprimento dos protocolos de segurança. Os incêndios florestais cada vez vão ser maiores e mais destrutivos, mas a perda da vida humana deve ser evitada a todo o custo.
"Não podemos evitar os riscos, mas podemos preveni-los."
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