segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Incêndios 2010 (Greenpeace)

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Há áreas em Portugal que já arderam catorze vezes em três décadas

in Público 20.09.2010 - Por Ana Fernandes




Não são mais que imberbes rebentos. Arderam há três anos mas já estão a ser pasto de chamas novamente. São muitas as áreas no país que ardem e voltam a arder num curto período de tempo, o que indica que ali há dedo dos pastores. Daí que alguns critiquem a recente decisão do Governo de pagar a alimentação do gado que perdeu o seu pasto nos incêndios. "É um incentivo para que continuem as queimadas", afirmam. "Não vamos deixar morrer os animais", responde o ministério.



A relação entre a pastorícia e os incêndios em determinadas áreas - caso da regiões em volta de Castro Daire/Marco de Canaveses ou em redor de Mangualde/Gouveia, para dar alguns exemplos - fica clara quando se olha para a quantidade de vezes que uma mesma zona ardeu nas últimas três décadas. A equipa de José Miguel Cardoso Pereira, do Instituto Superior de Agronomia (ISA), fez este levantamento. E detectou inúmeros matos que insistem em pegar fogo amiúde, contra todas as probabilidades."A recorrência de fogo é tão grande em determinadas áreas que pode dizer-se que são seguramente zonas tradicionais de pastorícia", diz Cardoso Pereira. Com dados disponíveis para 34 anos - de 1975 a 2008 -, a equipa do ISA mapeou as áreas ardidas, constatando que há zonas que, neste período de tempo, já arderam 14 vezes.


"Efeitos muito perversos"


Em condições normais, segundo os estudos de Cardoso Pereira, uma área está pronta para arder ao fim de cinco anos depois de ter sido consumida pelas chamas. Ou seja, se uma mesma área registou incêndios mais de seis vezes nestes 34 anos, pode dizer-se que há uma enorme probabilidade de ali terem sido feitas queimadas para renovação das pastagens. Que muitas vezes se descontrolam.


O uso do fogo na renovação das pastagens é ancestral. É a forma mais barata de o fazer, tanto mais que muitas vezes é feito em áreas marginais, onde roçar o mato é difícil ou nem sequer compensa. Porém, as queimadas estão proibidas na época dos fogos. Mas continuam a ser feitas.Aliás, olhando para os relatórios dos incêndios deste ano, a GNR identifica claramente as queimadas como uma das causas mais frequentes dos fogos. A Polícia Judiciária tem também anunciado a detenção de pastores como alegados incendiários. Rui Almeida, responsável pela Directoria do Centro da PJ, adianta que, dos 36 detidos este ano, dois são pastores e sete indicaram ser agricultores.


Esta relação próxima entre a pastorícia e os incêndios leva muitos a considerar "um risco" a decisão do Ministério da Agricultura de final de Agosto de estabelecer uma ajuda de emergência à alimentação animal "com vista a compensar as perdas ocorridas nas áreas de pastoreio ardidas" nesta época de incêndios - que só termina no próximo dia 15 de Outubro. No caso das ovelhas e cabras, está previsto um valor de 40 euros por cabeça e, no caso do gado bovino, a ajuda sobe para os 100 euros por animal.


"A medida pode ter efeitos muito perversos", diz Carlos Aguiar, da Escola Superior Agrária de Bragança, especialista em pastagens. "Os pastos de Verão são de baixo valor alimentar, estão secos, o que em si agrava o risco de esta medida incentivar ainda mais o uso do fogo para a renovação das pastagens", acrescenta.


"Abre um precedente complicado, pois, se as pessoas perceberem que se arderem os pastos recebem apoios para a alimentação animal, serão incentivadas a continuar a fazê-lo", diz Henrique Pereira dos Santos, arquitecto paisagista. "É uma medida que incentiva as pessoas a gerir o território de forma absurda", acrescenta.


"Não apoiávamos os agricultores e deixávamos morrer os animais?" contrapõe o Ministério da Agricultura. "Era nossa missão ajudar, porque corríamos o risco de, daqui a um mês, se falar de uma grande mortandade".


"É uma medida justa, é preciso ajudar os agricultores que ficaram sem pastagens, mas tem de ser bem controlada para não beneficiar ninguém indevidamente", argumenta por seu lado Paulo Rogério, da Associação Nacional de Criadores de Ovinos da Serra da Estrela. Se a acha perigosa? "Talvez pudesse vir a ser se não fosse só para este ano, mas como é uma medida que não vai ficar, decidida já depois dos incêndios, não me parece que seja vista como um incentivo", acrescenta.


Enquadrar a pastorícia


Com ou sem incentivos, o certo é que esta prática continua, com as consequências que se conhecem. Têm sido detidos alguns pastores mas a repressão também pode ser contraproducente, empurrando-os para a clandestinidade. Que se traduz num aumento das ignições na calada da noite.


"Tem de se investir no enquadramento técnico da pastorícia", defende Cardoso Pereira. Já hoje, os membros do Grupo de Análise e Uso do Fogo dão apoio a alguns pastores para fazerem queimadas em segurança. Mas são ainda uma minoria."Os pastores produzem riqueza e devem ser acarinhados. Muitas vezes o problema está em não terem acesso à terra, o que os obriga a fazerem pastoreio de percurso, renovando, através do fogo, as pastagens de que necessitam", diz Carlos Aguiar, lembrando a quantidade de terra que o país tem devoluta, sem que quem dela necessita lhe possa aceder. A criação de um banco de terras, tão exigida por muitos e várias vezes prometida, continua a não passar disso mesmo: uma promessa.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Distritos do Noroeste ardem mais que o resto do país

in Jornal Noticias 31/08/2010

Proporção de área ardida é muito maior no Porto, Braga e Viana do Castelo


Os distritos do Porto, Braga e Viana do Castelo ardem mais vezes e registam uma maior proporção de área ardida do que o resto do país. Em 19 anos, ardeu o equivalente a quase um terço do território do Noroeste. No país, a proporção de área ardida equivale a um quinto.


O Noroeste de Portugal é a região onde ocorre o maior número de incêndios em Portugal. Analisados os números, verifica-se que é nos distritos do Porto, Braga e Viana do Castelo que se situam 43% das ocorrências registadas em Portugal Continental. Se a análise incidir sobre o total de área ardida, a realidade é um pouco menos sombria, mas ainda assim preocupante: 15% da área ardida entre 1990 e 2008 localizavam-se nestes três distritos.


Dados revelados num trabalho académico realizado por Flora Ferreira Leite, uma investigadora no Núcleo de Investigação em Geografia e Planeamento da Universidade do Minho (UM), que tem por base os dados da Autoridade Florestal Nacional ao longo de 19 anos.


Comparativamente, no Noroeste a área ardida durante aquele período foi a equivalente a 28,3% (quase um terço) do território, enquanto a média do país corresponde a 19,6% (cerca de um quinto).


Para além de haver mais incêndios e da proporção de área ardida ser maior, foi também nos três distritos do Noroeste que se verificaram os fogos mais intensos e destrutivos. Uma ínfima parte daqueles incêndios ocorridos nos três distritos foram responsáveis por metade da área ardida nos 19 anos estudados pela investigadora. "No Noroeste, há muitos incêndios, mas 99,7% deles são pequenas ocorrências. Os restantes 0,24% foram os responsáveis por 49,7% da área queimada", referiu a investigadora Flora Ferreira Leite.


Os grandes fogos, como o de Carralcova, em Arcos de Valdevez, consomem a floresta durante dez a doze dias. "Em Carralcova, em 1996, as chamas começaram a um domingo, dia 6 de Agosto, percorreram cinco freguesias, e só terminaram na quinta-feira seguinte, dia 17 de Agosto, porque choveu", salientou a especialista em fogos florestais.

Em Portugal, os fogos começam ao domingo e sobretudo no mês de Agosto. "Os meses de Julho (16,7%), Agosto (38,6%) e Setembro (21,6%) são aqueles em que se registam mais incêndios. Mas também há um pequeno pico de 6,11% no mês de Março, por causa das queimadas agrícolas que se transformam em fogos", refere Flora Ferreira Leite. Quanto aos dias da semana, 13% dos incêndios começam à sexta-feira, 15% ao sábado, atingindo o pico de 18% ao domingo.

"Há uma ausência de gestão florestal a que se junta o êxodo rural e algumas tradições, como as queimadas, para fertilizar o solo", explica a investigadora, adiantando que cerca de 90% dos fogos têm origem criminosa.

domingo, 5 de setembro de 2010

Chuvas torrenciais podem "matar" solos florestais

Por Alfredo Maia, Jornal de Notícias


Técnicos da Autoridade Florestal Nacional estão a fazer o levantamento das necessidades de medidas de emergência para a erosão causada pelos incêndios, mas muito solo pode perder-se com as chuvadas repentinas e intensas se não forem atacadas já.

“Tenho estado no terreno e verifico que já há medidas em desenvolvimento no imediato”, garantiu ao JN o director nacional de Defesa da Floresta da Autoridade Florestal Nacional (AFN), Paulo Mateus.

Em S. Pedro do Sul, onde três grandes incêndios consumiram 4500 hectares, “já estava a ser retirado o material lenhoso ardido e a deixar material nos declives para que não haja escorrimentos”, exemplificou.

No levantamento das necessidades, os técnicos das direcções distritais que têm informação sobre a grandeza dos fogos, o tipo de solo, o seu declive e outras variáveis, estão a elaborar relatórios sobre as situações mais críticas.

Limpeza e desobstrução de linhas de água, sementeira de plantas herbáceas de emergência (sem esperar pela sua regeneração natural) e aplicação de resíduos orgânicos (troncos e ramos de árvores), formando barreiras contra o arrastamento de solo pelas chuvas, são algumas medidas recomendadas.

Os relatórios deverão estar fechados até ao dia 30 de Outubro, sendo aberto um período de candidaturas ao financiamento integral pelo Programa de Desenvolvimento Rural (PRODER), mas ainda é cedo para fazer um balanço. Os trabalhos ainda decorrem e ainda se prevêem mais incêndios.

Entretanto, muitos locais já foram atingidos por chuvas torrenciais – Seia e Chaves são dois exemplos – e já se perdeu muito solo, especialmente em zonas declivosas… “É uma contingência”, reconhece Paulo Mateus, considerando que o problema depende de várias condições e que “não vale a pena criar grande alarmismo, pois há sempre capacidade para recuperar”.

A capacidade de recuperação pode, porém, medir-se numa escala de tempo muito larga. Há situações em que o solo vai necessitar de mil ou dois mil anos para recuperar a sua fertilidade, pois foi arrastada pela água a sua camada vegetal e os nutrientes e o material fino, explica o agrónomo Eugénio Sequeira, especialista em erosão do Instituto Superior de Agronomia.

“Só com a primeira chuvada, pode perder-se 15 ou 30 toneladas de solo por hectare”, alerta.

O problema não é apenas físico, como pode parecer à primeira vista, pois os incêndios causam uma forma de erosão invisível, mas muito prejudicial – a erosão química: os nutrientes que estavam nas plantas e na folhada no solo e até no húmus, dependendo da intensidade e tipo de fogo, são dissolvidos e arrastados pela água.

E esta corre rapidamente pela vertente, se não houver plantas que a retenham. “E lá se vai a fertilidade!”, nota Eugénio Sequeira, lembrando que um pinhal com 40 anos pode precisar de mais de 60 para recuperar.

Jornal de Notícias, 05-09-2010

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