Em 1836, o alemão Frederico Varnhagen, na altura 1.º administrador geral das Matas do Reino, deixou a sugestão que se usasse a técnica do fogo controlado para diminuir o risco de incêndio em povoamentos de pinheiro--bravo, como o Pinhal de Leiria. Passados 174 anos, as suas sugestões foram ouvidas e, segundo as autoridades florestais, até à próxima época de incêndios o fogo controlado será finalmente usado de forma alargada a todo o País.
O fogo controlado, como o próprio nome indica, consiste na deflagração de incêndios por técnicos, de forma segura, para se proceder à renovação da flora local e limpeza de pastos e matas. "O fogo controlado é uma técnica que tem vindo a ser usada em Portugal desde 2005 e permite a gestão dos combustíveis e da paisagem nas florestas", explicou ao DN Miguel Galante, adjunto do secretário de Estado das Florestas e Desenvolvimento Rural.
O uso da técnica está disseminado pelo mundo, e a África do Sul é um exemplo, com o fogo controlado a ser usado há cerca de 50 anos. Navashni Gavender, especialista em gestão de fogo do Kruger Park (ver caixa), esteve em Portugal e explicou como é aplicada a técnica: " Primeiro fazemos uma pesquisa e analisamos o terreno. Desta forma sabemos que tipo de fogo é que o ecossistema precisa, quando e como podemos fazê-lo. Depois o fogo é posto de forma simples: um guarda do parque vai até certo local, ateia o fogo e vai-se embora", diz a sul-africana.
Tudo isto é feito de forma segura, pois a monitorização permitiu saber que a determinada distância existem barreiras para o fogo, como rios ou estradas. Os técnicos do parque estudam também as condições meteorológicas e para que lado vai soprar o vento, para dirigirem o fogo para determinado local.
"Já em 2006 trouxemos alguns peritos dos EUA para dar formação a um grupo de técnicos da Associação Florestal Nacional, Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade e organizações de produtores florestais", diz Miguel Galante.
A savana não é a floresta portuguesa, mas para a Navashni Govender - aliás, uma especialista que vai trabalhar também no fogo controlado em Portugal - o facto de termos uma floresta mais densa não prejudica esta técnica. "Na África do Sul, além da savana, também se faz fogo controlado em plantações comerciais, com árvores altas e mato denso. Uma das coisas mais importantes é a altura do ano em que se faz este tipo de fogo. É mais importante do que a densidade da floresta. Todo o processo é semelhante para se reduzir a matéria combustível", diz.
O Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB) quer começar, desde já, a aplicar o fogo controlado para diminuir os fogos na rede de áreas protegidas (ver infografia). "Consideramos esta uma técnica importante e queremos investir nela. Está previsto um investimento, mas depende das empresas associadas. Queremos começar já este Inverno", disse o presidente Tito Rosa.