quinta-feira, 10 de maio de 2012

REDEFENIÇÃO DE REACENDIMENTO


Post de: Emanuel de Oliveira
SMPC/GTF de Vª Nª de Cerveira

A Nota Técnica n.º 01 da Autoridade Florestal Nacional de 17 de Abril de 2012 vem reformular a definição de "reacendimento". De acordo com a recém definição, o reacendimento passa a constituir uma causa "Negligente".

Convém salientar que a palavra "Negligência" é o termo que designa falta de cuidado ou de aplicação numa determinada situação, tarefa ou ocorrência. É frequentemente utilizado como sinónimo dos termos "descuido", "incúria", "desleixo", "desmazelo" ou "preguiça".

Negligência Para o Direito

Lei nº 59/2007 de 04-09-2007; ANEXO - CÓDIGO PENAL
Artigo 15.º - Negligência

"Age com negligência quem, por não proceder com o cuidado a que, segundo as circunstâncias, está obrigado e de que é capaz:

a) Representar como possível a realização de um facto que preenche um tipo de crime mas actuar sem se conformar com essa realização; ou
b) Não chegar sequer a representar a possibilidade de realização do facto.
"

Ou seja, é a omissão aos deveres que as circunstâncias exigem.





Esta definição vem ao encontro do já praticado em outros países, no entanto cabe avaliar em que circunstâncias o combatente de um incêndio florestal é capaz, dadas as condições físicas, psíquicas e materiais pós-incêndio, de levar a cabo um rigoroso trabalho de rescaldo. Em qualquer país da Europa, um combatente (profissional) não excede as 12 horas num incêndio florestal. Nos EUA existem equipas especializadas exclusivamente para o trabalho de rescaldo (Hot Shots) acompanhados por técnicos florestais.


Ficam aqui quatro questões que creio serem pertinentes:

  1. O mesmo indivíduo que combate deverá proceder ao respectivo rescaldo (lembro que um mesmo combatente em Portugal pode estar diversas horas envolvido num incêndio ou em incêndios consecutivos)?
  2. Em caso de reacendimento quem assume a responsabilidade pelo rescaldo?
  3. Será que os sapadores florestais deixarão finalmente o combate e passarão a realizar os rescaldos, 1ª intervenção e vigilância em matéria de incêndios florestais, cabendo apenas aos bombeiros o combate?
  4. Quem avalia o rescaldo?

Dada a complexidade e a importância que o novo conceito suscita, assim como a responsabilidade de quem tem obrigações para evitar o "reacendimento" num incêndio florestal, transcreve-se seguidamente, na íntegra, o texto publicado:

"Os termos utilizados para classificar incêndios florestais são os constantes no manual ‘Classificação de Incêndios Florestais’ publicado pela Direcção-Geral das Florestas em 2001 (http://www.afn.min-agricultura.pt/portal/dudf/cartografia/manual-classificacao-de-incendios-florestais).

A necessidade de esclarecer/uniformizar critérios e procedimentos de carácter colectivo utilizados na base de dados do Sistema de Gestão de Incêndios Florestais – SGIF exige que seja reformulada a definição de ‘reacendimento’.

Esta reformulação tem como principal objectivo aumentar o rigor e a qualidade dos registos das ocorrências de incêndios florestais. Assim, o conceito de reacendimento passa a ser:


REACENDIMENTO:

É uma nova ocorrência que tem início no perímetro da área afectada por um incêndio recente que foi considerado extinto, ou seja, em que todos os meios já abandonaram o TO. São ocorrências que têm obrigatoriamente área ardida associada e às quais será atribuído o tipo de causa ‘Negligente’ e a causa a 711 – ‘Fonte de calor do incêndio anterior’.

A data e hora de início do reacendimento tem de ser posterior à data e hora de extinção do incêndio de origem."

5 comentários:

Paulo Bessa disse...

Emanuel... muito bom artigo.
Apesar de necessária, esta nova definição não é muito feliz ao conotar negativamente a actuação dos bombeiros.
Já verifiquei algum mal estar no bombeiros por causa desta nova definição.

Emanuel Oliveira disse...

Caro Paulo,

Os combatentes têm razão e todos consideramos necessária a redefinição, pois a maioria dos grandes incêndios florestais ocorrem por reacendimento, no entanto não podemos exigir aos mesmos que combatem, àqueles que se submetem a fortes radiações e a um esforço físico excessivo durante o combate, por várias longas horas, a procederem à mais dura tarefa do combate - o Rescaldo. Na minha opinião, deverão ser as equipas de sapadores, mobilizadas em brigadas de 10 a 15 elementos, acompanhados do técnico municipal com competências na área florestal e sob a supervisão do COS, a proceder ao rescaldo. Caberá ao técnico a detecção de pontos quentes, a definição da prioridade de intervenção das acções de rescaldo e a validação conjunta com o COS da intervenção realizada, procedendo igualmente ao levantamento da área ardida. Contudo, para que isto aconteça, as equipas de sapadores não poderão ser mobilizadas em acções de combate e deverão ser chamadas para o TO apenas para esta função. Lembro ainda que os veículos e o equipamento usado pelos sapadores não foi desenhado para o combate, mas para a 1ª intervenção, rescaldo e silvicultura. Igualmente, pergunto quem se responsabiliza por enviar uma equipa de sapadores para combater incêndios junto a moradias em Zonas de Interface Urbano-Florestal? Será que em caso de acidente por explosão de botija de gás, depósitos de combustível, etc., o seguro protege o sapador florestal, quando este não tem equipamento, nem formação, nem funções para este tipo de acções? Quem assume a responsabilidade!?

Paulo Bessa disse...

Emanuel,
Como sabes, a execução do rescaldo tem muito que se lhe diga. No distrito do Porto fez-se uma grande aposta nessa matéria, na altura pelo já extinto Governo Civil, através da aquisição das Câmaras térmicas. Na minha opinião... foi informação a mais numa área a que normalmente não se dá grande importância.
Penso que teria muito mais impacto caso fossem aplicadas na formação e demonstração em detrimento do seu uso em contexto real de rescaldo de incêndio. Mais uma vez os técnicos florestais poderiam dar aqui um grande contributo.
Não podemos exigir um bom rescaldo a equipas de bombeiros que têm de lidar com 10 a 20 ocorrências por dia (que acabam por ser uma pescadinha de rabo na boca). Deveríamos ter equipas especializadas nesta matéria.. ou pelo menos equipas que não estejam desgastadas pelo combate.
A utilização dos sapadores florestais seria uma boa/excelente solução. Contudo temos realidades muito diferentes... mesmo estando tão próximos!! Não estou a ver possível o seu empenhamento no meu distrito...

Emanuel Oliveira disse...

Paulo, pelo que podemos apurar pela nossa opinião, apesar de distritos diferentes e com características diferentes no que respeita a incêndios, a preocupação é comum e o papel do técnico municipal é fundamental! Creio que temos que mobilizar todos os técnicos sobre esta e outras questões de importância operacional e de maior prevenção. Nós os dois não somos os únicos com estas preocupações, por isso há que ouvir e partilhar com os demais colegas! Seria fundamental, pelo menos ao nível da nossa Região Norte!

Reinaldo Baptista disse...

Aqui está um tema interessante, sou bombeiro a mais de 25 anos e o rescaldo sempre foi uma fase importante no combate nos incêndios florestais.
Mas nos últimos anos tem-se se escorado essa fase na anciã de ter disponível equipas para o combate e depois temos reacendimentos complicados que fazem as equipas de combate regressarem várias vezes ao mesmo incêndio.
Julgo que essa fase deve ser da responsabilidade de todas as entidades envolvidas no combate, é lamentável apagar as chamas e depois deixar o rescaldo para os outros, porque facilmente a mesma equipa poderia fazer o rescaldo, basta querer, na minha zona é assim que se trabalha e quando existe um reacendimento sabemos logo quem não fez o seu trabalho como deve ser.
É tudo uma questão de mentalidade e gestão de meios.

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