domingo, 29 de janeiro de 2012

O Triângulo do Combate a Incêndios Florestais

Desenvolvido e postado por: Emanuel de Oliveira
SMPC/GTF de Vila Nova de Cerveira

Os incêndios florestais para se desenvolverem dependem obrigatoriamente daquilo que denominamos por triângulo do fogo, cujos factores de desenvolvimento encontram-se intimamente interligados: Fonte de Ignição/Oxigénio/Combustível. Apenas quebrando uma das vertentes, poderemos pôr fim ao fogo e ao incêndio florestal, o que por vezes, dada a disponibilidade no terreno, torna-se num objectivo difícil de se cumprir. Somente com eficácia e eficiência, seremos capazes de cumprir de forma segura e sob controlo, um combate que cumpra o objectivo de extinção do incêndio florestal.
À semelhança de outros colegas do distrito e do país, durante vários anos tenho vindo a acompanhar, junto dos combatentes, os incêndios florestais, sejam eles fogachos ou grandes incêndios florestais (GIF), estudando e analisando-os, planificando e executando acções de âmbito municipal visando a prevenção e a criação de oportunidades de combate. A proximidade junto dos combatentes, alguns com muita experiência, tem-me permitido assistir às dificuldades que se apresentam na 1ª intervenção e no combate, bem como se comporta o fogo numa determinada posição no relevo, num dado período horário do dia. A experiência e os saberes recolhidos junto das equipas do CNAF 16, das EPF-GNR (antigo Corpo da Guarda Florestal), do Corpo de Bombeiros de Vila Nova de Cerveira e de alguns elementos (hoje reformados) que pertenceram à antiga Brigada 28 dos Serviços Florestais, têm permitido uma melhor interpretação das tácticas adoptadas em combate e o histórico dos incêndios.
A minha participação em acções de vigilância e fiscalização tem contribuído para um conhecimento mais aprofundado das sensibilidades do território, as motivações que poderão estar por detrás das ocorrências, permitindo-me georreferenciar com exactidão os locais de ignição, bem como acompanhar e estimar de forma rigorosa o índice de queimas de sobrantes, principalmente quando ocorrem dentro do período crítico, com risco potencial para dar origem a um incêndio.
A planificação e a execução das acções de defesa da floresta contra incêndio tiveram por isso, em primeira linha de conta a experiência recolhida no terreno. A identificação e tratamento de pontos de gestão estratégica, as faixas de gestão de combustíveis, a criação de mosaicos, a beneficiação de rede viária, é um conjunto de acções que deve ter em atenção o número de ocorrências num mesmo raio, a tipologia dos incêndios ao nível do comportamento do fogo e os incêndios de desenho.
Toda a experiência recolhida junto dos combatentes, o acompanhamento muito próximo na tomada de decisão para a execução de acções de prevenção e o profundo conhecimento do território, levou-me a considerar que o combate aos incêndios florestais depende daquilo a que chamo o Triângulo do Combate a Incêndios Florestais:


A Ciência e o papel do Técnico
Ora o técnico do GTF do município, joga aqui um papel essencial, mediante o recurso à ciência, através dos diversos meios e tecnologia que se encontram ao seu alcance: análise meteorológica, análise espacial, detecção remota, análise de incêndios e compreender todos os processos que influenciam um incêndio florestal, sem esquecer a sua acção no acompanhamento das ocorrências, onde ganhará experiência e conhecerá de perto os obstáculos no combate aos incêndios florestais. Dada a situação do mundo rural e do sector florestal, impõe-se ao técnico com responsabilidades em matéria de defesa da floresta contra incêndios, um papel cada vez mais operacional e interventivo, de conhecimento profundo do território e das populações, na proposta de acções que criem oportunidades de combate e de defesa, no acompanhamento das ocorrências e no apoio à tomada de decisões no combate.

Os Meios disponibilizados – Decisões políticas


No entanto, este trabalho só é possível, sempre e quando o técnico dispõe de recursos no seu município que permitam não só avaliar previamente, mas também levar a cabo a importante tarefa de execução das acções planificadas. Ora, os meios não dependem dos técnicos, mas sim de medidas operacionais colocadas à disposição por parte das entidades governamentais centrais, regionais e locais, ou seja de meios disponíveis estabelecidos por decisões políticas. Estas decisões, quer de âmbito nacional quer municipal, são essenciais para colocar em prática as medidas estabelecidas na prevenção e no combate aos incêndios florestais. Sem estas decisões de fórum político seria impossível existirem meios e apoios para o combate. Daí que grande parte da responsabilidade recai sobre quem toma decisões, pois torna-se na “fonte de ignição” do triângulo de combate. A disponibilidade de meios materiais e humanos depende de decisões políticas.

A Experiência dos Combatentes
Contudo, o combate aos incêndios florestais não se faz apenas com os métodos científicos aplicados pelos técnicos e/ou com os meios colocados à disposição pelas decisões políticas. A base do triângulo de combate assenta na experiência dos combatentes, profissionais ou voluntários, pertencentes às diversas equipas que se encontram no teatro de operações (bombeiros, força especial de bombeiros, sapadores florestais, corpo nacional de agentes florestais, equipas GIPS/GNR, equipas AFOCELCA, etc.).
A experiência e a formação dos elementos da equipa é factor essencial no desenvolvimento do combate, por muitos meios e apoio técnico que possua. Por vezes encontramos nos incêndios equipas muito bem equipadas, mas que demonstram dificuldades no entendimento das operações, na execução das tácticas e até mesmo na utilização dos equipamentos. São diversos os exemplos da falta de experiência: a dificuldade nas rádio-comunicações, a dificuldade na orientação e navegação com cartografia, a dificuldade no entendimento do comportamento do fogo, a dificuldade na execução de manobras de contenção e consequentes saltos, rescaldos defeituosos e consequentes reacendimentos, entre outros casos. Daí que não se pode exigir demasiado a equipas cujos elementos são muito novos ou que apenas se vêem e trabalham em conjunto uma vez por ano, num curto período de incêndios florestais. É notória a diferença em equipas, onde os elementos têm mais de 10 anos de combate ou que lidam em grande parte com incêndios florestais ou que trabalham durante o ano em acções de fogo controlado ou queimadas.
 
Conversando com combatentes mais velhos da Corporação de Bombeiros de Vª Nª de Cerveira e da extinta Brigada 28 e, com cerca de 30 e 40 anos de experiência, pude constatar a diferença nas tácticas de combate de outrora, muitas vezes baseadas numa análise empírica do comportamento do fogo. É necessário recordar que só na década de 80 do século passado é que começaram a surgir os primeiros veículos de combate a incêndios florestais, pois até ali o combate era realizado basicamente com recurso a ferramentas e tácticas denominadas vulgarmente de sapadores, por serem muito utilizadas pelas extintas brigadas florestais, pelo que dotaram os combatentes de um elevado conhecimento do território e do comportamento do fogo.

Ora como pudemos observar, os três lados do proposto Triângulo do Combate a Incêndios  Florestais são cruciais para garantir a eficácia e a eficiência das acções contra os incêndios florestais. A conjuntura sócio-económica actual e o crescente número de grandes incêndios das últimas décadas, obriga-nos a colocar em prática este triângulo. Recordando porém que o eficaz e eficiente combate aos incêndios florestais inicia-se com medidas politicas atempadas, com acções técnicas prévias de defesa e prevenção devidamente estudadas e com preparação e experiência de todos aqueles que participam directamente no combate. Todos somos combatentes, todos que de algum modo nos incluímos directamente ou indirectamente numa das vertentes deste Triângulo de Combate.

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